segunda-feira, junho 28, 2010

O Mistério da Aurora (Parte II)

Por instinto, levei as duas mãos à face, em forma de "x", para me proteger. Os cães, contudo, passaram como balas pelos meus tímpanos. Gelei. E, num sobressalto, virei-me para ver e entender - ou pelo menos tentar - o que acontecia. Meus cães latiam, ferozes, para o espectro mais impressionante que já vira.  Tinha cerca de dois metros de altura.  Tudo isso para dar conta dos músculos incontáveis que pareciam ter sido feitos à mão (um físico que fazia Miro Moreira parecer o Pinóquio). Era como uma miragem. Não havia nexo acreditar que era real.

Seus cabelos eram como os de um ator mexicano. Minha memória me trouxe, de pronto, Carlos Daniel Bracho. "A Usurpadora" fez muito sucesso, sim. E que me atirem a primeira pedra quem nunca a assistiu. Mas do amor de Paulina ele só tinha as madeixas castanho-escuro. Ainda assim, num formato e corte muito superiores.  Suas  sobrancelhas eram másculas, mas não menos bonitas. Tinham pelos espessos, distribuídos de maneira equilibrada. Tudo para coroar seus olhos cor de mel. Misteriosos, alegres e brilhantes; muito brilhantes.  Mais abaixo, estava o nariz. (Seria o Doctor Rey o responsável por aquilo? Não! A estrutura era muito bela para ter sofrido interferência de um cirurgião.). Ele era afilado e perfeitamente arrebitado. Não chegava a ser feminino - até porque tinha o tamanho proporcional à face de homem -, mesmo assim era incrível. Seus lábios, naturalmente rosados, eram finos na parte superior, em contraposição à inferior que era mais grossa. Deveriam ter saído da mesma "fábrica" que fez os da Angelina Jolie. A diferença estava no caráter viril que eles denotavam. Por fim, o queixo. Era quadrado e imponente. Conferia ao seu rosto uma estrutura indiscutivelmente sintonizada. Em qualquer ângulo. Se eu tivesse metade de toda aquela beleza, mulher nenhuma me "daria um fora". Mas, enfim... O pescoço, musculoso como todo o resto, sustentava sua face de deidade. Parecia milimetricamente pensado para compor aquela "estátua viva". Seu peito e braços estavam nus. Suas calças eram pretas. Pareciam petróleo em estado sólido. E o cinto, com uma fivela com um design excepcional (lembrava um brasão), combinava com o dourado que vinha de seus pés. 

Meus fiéis escudeiros continuavam latindo. Rosnavam, impacientes, enquanto a criatura me contemplava com um leve ar de desdém. Ela flutuava e, à medida que a luz dourada que emanava de seu corpo se tornava mais fraca, o personagem colocava os pés, adornados por cuturnos dourados - do mais precioso quilate -  no chão. Pensei que, quando isso acontecesse, ouviria um agudo som de metal, mas, para minha surpresa (mais uma nesse dia esquisito), foi como se o chumbo encontrasse uma piscina de plumas dum nobre ganso. Engoli em seco.

__ Deveria ver seu rosto agora, paspalhão! - Disse aquele ser escultural. Fora a voz mais impressionante que já ouvira na vida. Fazia o Cid Moreira parecer o narrador do Pato Donald.

Tentei responder, mas minhas cordas vocais pareciam ter sumido. Abri a boca em "o", mas isso só deve ter deixado minha face ainda mais caricatural. O homenzarão, com cara de jovem, contudo, sorriu. E era, para mais um de meus espantos, como ouvir um violoncelo afinado.
__ Tenho muito o que dizer. A partir de hoje, sua vida nunca mais será a mesma. - Pronunciou. 

Enquanto falava, movia-se ao meu encontro. Luque e Sol, aqueles bananas, pareciam coelhos, de tão dóceis agora. Sabia que, um dia, me arrependeria por ter escolhido cockers em vez de pit bulls. Mas eles me pagariam, quando tudo aquilo tivesse acabado. Daria um banho bem frio e demorado em ambos.

Instintivamente, dei dois passos para trás. Encostei na máquina de lavar e lembrei que continuava de cueca branca, como costumava ficar sempre que ia dormir. A lavadora de roupas estava fria. Dei um leve salto e, dessa vez, o "sr. Todo Trabalhado no Luxo" gargalhou.

__ O que - que - que você quer? Baubuciei. E quis, no mesmo instante, não ter perguntado nada. Minha voz soou mais estridente que nunca. Fazia uma vuvuzela parecer instrumento de orquestra sinfônica. Suspirei - não sei se pelo constrangimento ou pelo medo que sentia.

__ Não precisa ter medo, Artur! - Ôpa! Eu não me apresentara... Como sabia meu nome? Aquilo já estava me deixando nervoso. Rá! E quando eu assim me encontro... Que diferença faz? Acho que, nestas circunstâncias, nem se eu ficasse verde e triplicasse de tamanho adiantaria. __ Você não me conhece, mas venho o observando desde que você era um bebezinho. - Continuou.

__ Como assim? Eu não sei quem é você. Na verdade, nunca nem imaginei ninguém assim. Em todos esses anos de historinhas, livros, filmes, novelas e otras cositas más. - Consegui, por fim, falar com certa fluência. Ao acabar, ele me contemplava, tranquilo e à vontade. Era como se fosse seu amigo, embora eu não soubesse disso. Nem meus amigos imaginários mais "bem elaborados" poderiam ser comparados àquilo. Ele pareceu ignorar parte do que eu dissera:

__ Bom, já que você não perguntou, me apresentarei. Sou Julius, muito prazer. - Enquanto sorria, simpático, ele estendeu a mão direita para me cumprimentar. Aquela composição cheia de grandes e alongados dedos estava coberta por uma luva do mesmo material das botas. Observava aquela porção do todo , atônito. Parecia brilhar hipnoticamente. Como se percebesse, Julius sorriu e, com um estalo ágil de dedos, a estrutura começou a se esfarelar. A cena me lembrou uma ampulheta. O estranho é que não havia pó caindo. A coisa sumiu e pude contemplar sua mão, aparentemente humana.  __ Não vai apertá-la? - Questionou-me, cerrando os olhos.

__An... É... Claro! - Concordei por fim. Fiz o que ele esperava e, graças a Deus, não era uma estátua fluorescente quando terminei de realizar o gesto. Enquanto largava sua mão, percebi que, em seu pulso, havia uma tatuagem. Não como essas que a gente vê no Miami Inc. Ela era dourada. Simples, mas bonita. Traços perfeitos. E era idêntica à que eu tinha em meu pulso esquerdo. (Tá, tudo bem! A minha não era bem uma tatuagem. Era uma cicatriz, que estava ali desde que me entendo por gente. Mas, ainda assim, era idêntica.).  __ Que bonita tatuagem - eu disse! Julius virou o pulso para si e concordou com um leve e  elegante balançar de cabeça.

__ A sua também - retrucou! E ao olhar para meu pulso outra vez, minha "cicatriz de infância" piscava. Senti-me tonto. E as úlltimas coisas das quais me lembro são de uma gargalhada divertida e de Luque lambendo, com aquela língua gigantesca e ensopada, minha boca.

CONTINUA...

sexta-feira, junho 25, 2010

O Mistério da Aurora

Eu estava exausto. O dia todo fora estranho. Acontecimentos e situações inusitadas. Bizarras em algumas circunstâncias, até - o morador de rua que me chamou pelo nome ao pedir uma esmola! Eu concluira, depois de tudo, que daria um tempo com livros e outras obras de ficção. Estava na hora de uma dose dupla de realidade... Esta seria a minha mais prudente escolha.

Cheguei em casa, exausto. Com espasmos pelo corpo, embora estivesse quente. Joguei a mochila na cama e, despindo-me às pressas, dirigi-me ao banheiro. Um bom e demorado banho me faria bem. Ajustei a chave da ducha para o modo "morno" e, lentamente, me lavei. Usei tudo o que tinha direito. De sabonete a sais de banho. Sentia-me, desconfortavelmente, sujo. E eu sabia que, para algumas impurezas, não há água ou espuma suficientes. Depois dos longos minutos ininterruptos, puxei minha macia toalha e me pus a secar. Meus músculos me irritavam. Eu me encontrava vermelho em determinadas regiões do corpo. Cogitei a possibilidade de as manchas serem resultado dos esfregões intermináveis. Depois de um longo suspiro, encaminhei-me de volta ao quarto. Ele tinha um cheiro que me fazia espirrar. Insistentemente. Fechei a persiana, após me certificar de ter fechado os vidros. Peguei minha cueca branca, para não perder o costume - algo que se tornara mania com o passar dos anos. Estava faminto, mas o que queria, mesmo, era dormir. Arrepiei-me! Um misto de prazer e medo. "Mas que droga de dia fora este?" (Pensei comigo mesmo). Separei meus cobertores. Estendi cada um de maneira metódica, e me aninhei embaixo deles, apagando o interruptor acima de minha cabeceira e acendendo, de pronto, o abajour no canto direito, sobre o criado mudo judiado pelo tempo. Nele estava o livro que relia, após anos: "Se Houver Amanhã", do aclamado (e brega) Sidney Sheldon. Ao abri-lo, lembrei-me da promessa de mais cedo: "leitura só depois de algum tempo". Seria importante para que eu conseguisse colocar as ideias em ordem. Fechei os olhos, crente que a inconsciência chegaria sem muitos esforços. Doce ilusão! Passara-se mais de 40 minutos e eu olhava, aturdido, o teto branco que ameaçava se lançar sobre mim. "Mais fantasias!", concluí. Levantei-me. Todos dormiam. Resolvi ir até à lavanderia, verificar se meus cachorros estavam bem. Aproveitaria a chance e contemplaria o céu, adornado por poucas estrelas e uma misteriosa lua minguante. Abri a porta de modo a não fazer barulho e pude ter certeza de que, nesse momento, algo veloz e quase imperceptível  paasou  por mim. Outro arrepio. Agora na região espinal. Não pude reprimir a risada. Luque e Sol dormiam, até meu terceiro passo. Foi aí que tudo aconteceu! Uma coruja piou (em plena cidade grande), e os dois inofensivos filhotes avançaram, mordazes, sobre mim!

CONTINUA...

segunda-feira, junho 21, 2010

Desde Quando


Não dá para saber... Desde sempre? Son(nh)o. E é durante a ação que o inconsciente vem à tona e nos toma. Inunda-nos! Como se uma comporta tivesse sido escancarada e a correnteza passasse a dezenas de quilômetros por hora... Carregando uma infinidade de detalhes e deixando, em contrapartida, grandes consequências.

Desde quando se sonha, é preciso ter em mente que se faz preciso estar acordado. Este é o acordo. Olhos abertos. Pés no chão... Mãos ao alto (por vezes). Porque se espera que assim chamemos a atenção de Deus. E Ele nos vê. Fato! Independentemente de como nos movimentamos. Pouco importa o fluxo de nossa urgência e necessidade. Desde quando sonhamos...

Com um amor impossível. Invisível como o ar. Como a água que não refresca. Mais distante que a intocável estrela. Perto e longe. Dentro e fora. Sonho. Desde quando?

Olhar distante. Que belo horizonte! Longe... Quase fictício. Tudo preso pelas janelas. Não da sala de sua casa, apenas. Mas da alma. Imaginativa. Enganadora. Infantil. Imprescindível.

Desde quando se está disposto a correr pelas ruas. Buscar seus ideais. Contar com a proteção divina. Encontrar soluções para os problemas que encobrem a aurora. 

Desde quando se quer ser atrevido o bastante para não deixar de sonhar. Com prudência. Apaixonado. Intenso.

Desde quando você se despe da coerência. Esquece de corrigir e corrigir(-se). Apenas sonha. Desde quando considera importante. Importa. Porta. Que se abre. Quando se sonha. Desde quando se sonha.

domingo, junho 13, 2010

Sem cortes, claquetes ou interrupções. Gravando!




Outra manhã cinzenta. Fria. E triste! Sem motivos aparentes. Sem revelações convincentes. Só marasmo. Nem uma única novidade. Como um filminho "água com açúcar". Um roteiro pobre, com atores anônimos. Sem ápice. Só começo e meio. Sem perspectiva de fim. Não há tempo para novas tomadas. As falas não podem ser repassadas e as emoções serão mostradas como forem expressas. Sem muita maquiagem. O figurino de péssimo gosto. Iluminação baixa. Enfim, um drama de quinta categoria, que nem os menos entendidos parariam para assistir. Cenas monótonas. Cores mortas. Trilha sonora inadequada. E o pior é que o diretor tem noção de todos esses deslizes. Mas ele nem se importa! Com o orçamento miserável ao seu dispor, foi o que deu para fazer! Esse fiasco, por pior que seja, vai ser produzido. Ainda que seja para servir de referência para aquilo que o universo cinematográfico não deverá fazer! Porque enquanto houver a ficção, a farsa e fantasia continuarão a existir... Com uma linguagem disfarçada que "coisifica" o homem e humaniza a coisa.

sábado, junho 12, 2010

Eu sou o Tarzan. Sai pra lá, macaca Chita!



Céu aberto. Perigo à vista! É isso mesmo. E às vezes tudo o que resta é você. Sem ninguém. Onde tudo o que tem é o nada. O ermo. Não confie. Não ame. Não sonhe. Não crie expectativas. Deixe de existir! Porque esta será a única maneira de cultivar essa floresta de negações.

Sua boa vontade é como sapato de cristal em pé de gata borralheira - e quero ver conseguir se locomover neste chão castigado pela seca. Sua dedicação e preocupação são como carne nobre lançada aos animais. Seu espírito altruísta e boa vontade não passam de elementos desencantados, que não fazem mais o menor efeito.

Portanto, seja você. Apenas. Envolva a si próprio em seus sonhos. Suas emoções em seus textos. Seus desejos em cada ação que realizar. Mas se importe menos. Há pessoas que não merecem tanta atenção assim. Procuram-no por iteresse. Porque é cômodo tê-lo como aliado. Para aconselhar quando estiverem prestes a enfiar o pé na jaca. Quando a prova for difícil demais para seu cérebro de minhoca. Ou quando a apresentação em grupo for constragedora para sua dicção defeituosa e voz de taquara rachada...

Por mim, os bichos ficariam restritos aos zoológicos, às savanas e às matas que lhes são peculiar. Trazê-los para a domesticação dá um trabalho da moléstia. E já há muito sofrimento em jogo...

Quer saber? De agora em diante, terão de caçar sozinhos! Aventurem-se na "selva de pedras". Usem as garras. Enganem outras presas, predadores insaciáveis. Eu já estou precavido. Já aprontei as armadilhas. Carreguei meu rifle. Então é bom manter uma distância considerável. Não tenho MAIS medo de suas peripécias e macaquices!

quinta-feira, junho 03, 2010

Imper(hiper)ativo



Em câmera lenta. É assim que a gente costuma se sentir depois de horas a fio trabalhando. Após ter dedicado tempo e energia excessivos num projeto. Ao término do intento, é como se a vida passasse a discorrer mais de - va - gar! Sem nenhuma pressa ou ansiedade. Porque o seu corpo e mente pedem descanso. Não só para que se consiga relaxar, mas para que seja possível refletir a respeito de tudo quanto foi feito... Detalhes. Caretas. Medos. Risos. Silêncio.

É um corre-corre daqui; uma agitação de acolá. Senta. Levanta. Dorme pouco. Fica acordado até tarde. Passos largos. Mãos furiosas. Assim fica melhor. Aquela cor é mais agradável. A ideia não atende às nossas necessidades. Néscios. Idades.

Faça. Venda. Divulgue. Supere-se. Mostre. Impacte. Inove. Mude. Cuide. Veja. Reveja. Ouse. Ore. Creia. Faça crer. Comova. Surpeenda (se)... E não dá para ficar parado. Há muitos detalhes com os quais se preocupar. Há muitas minúcias que merecem atenção. Os textos precisam ser revisados. Os conceitos, revistos.

O prazo está prestes a expirar. A gente nem lembra de inspirar. Esquece-se de respirar. E apenas faz - ou tenta fazer. Acontecer. Num meio onde pouco importa o quê ou como se pensa. Onde suas propostas geralmente são rejeitadas. Para maior sinceridade, elas nem são lidas. Mas, ainda assim, avaliadas.

E então, quando as coisas se acalmam; quando sobram alguns valiosos segundos, a gente pode refletir. Não como agente. Mas como seres humanos. Que se tornaram hiperativos por conta do selva de imperativos. Que nos cutucam. Nos pirraçam. Nos podam. Cortam-nos pela raiz. Tudo para que geremos não o nosso, mas o fruto que eles almejam. No período e da meneira que esperam.

E se pode perceber, por fim, que tudo o que não se pode fazer é ficar parado. Mas decidir como e por que quer se movimentar. Idependemente do que seja imposto. Sem que se importe com o ritmo.