terça-feira, novembro 02, 2010

Salve-me se puder

"Ou você faz por merecer, ou mereça, por aquilo que não faz.
                                                                                        (Fernando Lapolli)

Foi mais ou menos como estar à margem de um rio nervoso e largo. Suas águas, agitadas, lembram-me do dia em que o atravessei. Ele se mostrava simples e tranquilo. Pricipalmente porque onde me encontrava, tudo era meio sem graça. Era como se eu precisasse de uma dose aventura. E o outro lado, neste sentido, piscava, sedutor. Como um presente que se recebe, de modo que seu uso seja gradativo e constante. Um pé após outro, fiz a travessia lenta e sossegada. A caminhada era tão boa, que não me importara com o nível da água: primeiro nos artelhos; nos joelhos em seguida; depois na cintura, até que atingira meus ombros. Quando me dei conta, pisquei aturdido. Estava mais consciente da situação crítica que enfrentava, no entanto voltei a me concentrar no que vinha fazendo. Senti os pés deixarem de tocar o solo; percebi quando comecei a controlar a respiração para não me deixa afundar. Notara, de pronto, quando a profundidade era consideravelmente superior, porém me focava em sobreviver. Esta era meta (nada simples, cabe lembrar). Continuei me movendo, sem pressa ou desespero. Principalmente porque este me assolaria quando eu tocasse o lado oposto de onde eu saíra. Agora minha visão estava menos turva, mesmo com todo o excesso de água na cara, e eu podia ver que não fora uma boa ideia. Achava que estava “saindo do lugar comum”, confortável e seguro, para trilhar por um terreno amplo e verde – repleto de buracos e crateras sob a relva resplandecente e convidativa. A essa altura, conseguia concatenar. Assimilava com maior velocidade a gravidade dos fatos. Ainda assim, era melhor continuar o percurso. Esperaria que uma armadilha impiedosa me massacrasse antes. Falta de ar. Condensação. Todavia eu não parava. Devagarzinho, chegava mais perto. Só mais um pouquinho. Um espeço ínfimo, se comparado a todo o restante do trajeto. E, de repente, eu estava lá. Trôpego. Estirado no chão, procurando alimentar minhas ávidas narinas com seu alimento vital. Enchi o pulmão por diversas vezes, ainda de olhos fechados, e outra tantas o esvaziei. Abri os olhos. Pus-me de pé, com muito pesar. Olhei a minha volta. E não tive a menor dúvida: precisava voltar, e rápido, para o lugar do qual jamais deveria ter saído.